Opinião

Depoimentos mostram que os chefes militares apoiavam o golpe contra Lula

Por Carlos Newton

O irregular e ilegal Inquérito do Fim do Mundo, aquele que já vai para seis anos e não acaba nunca, é uma farsa grotesca para impedir que realmente se apure a participação dos comandantes militares e do oficialato da ativa na preparação do golpe de estado para impedir a posse do governo Lula da Silva.

As provas materiais e testemunhais são abundantes, mas os investigadores da Polícia Federal e da força-tarefa mantida pelo ministro Alexandre de Moraes no Supremo fingem que não estão vendo nada, esquecem de fazer determinadas perguntas nos interrogatórios dos envolvidos, e assim o tempo vai passando e la nave va, cada vez mais fellinianamente.

SURREALISMO PURO – Não se poderia esperar outra coisa aqui no Brasil, onde se pratica a política mais surrealista do mundo e a Justiça funciona à la carte, digamos assim, interpretando as leis de acordo com o freguês e se envolvendo em tudo, a ponto de o presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, proclamar, publicamente: “Nós evitamos o golpe. Derrotamos o bolsonarismo”.

Mas há controvérsias. Como se sabe, as Forças Armadas estavam sendo comandadas pelos oficiais mais bolsonaristas e antipetistas que foi possível encontrar. O general Freire Gomes, o almirante Almir Garnier e o brigadeiro Baptista Junior eram e são absolutamente antipetistas.

Os três depoimentos dos chefes militares à Polícia Federal convergem e confirmam que o golpe era abertamente discutido no governo, notadamente através de estado de defesa, com garantia da lei e da ordem (GLO), a solução mais aventada.

SEM INVESTIGAR – Essa preciosa informação passa direto e não é mencionada pelos investigadores. Mas já ficou claro que os três apoiavam o golpe, caso contrário jamais aceitariam participar de reuniões convocadas para discuti-lo, como foi o caso.

Nos depoimentos eles dizem que eram contra o golpe, mas sabe-se que eram a favor se Lula da Silva vencesse e fosse provada fraude eleitoral. Mas também sabe-se, por outros testemunhos, que o almirante Garnier era a favor, com ou sem fraude, e queria colocar as tropas na rua. É claro que 0 general Freire Gomes e o brigadeiro Baptista Junior também eram a favor, mas recuaram na undécima hora, depois que o Alto Comando do Exército se opôs.

Mesmo assim, em dezembro, Bolsonaro ficou na dúvida e convocou o general Estevam Theóphilo, que tinha o comando direto das tropas do Exército em todo o país. No encontro, o general Estevam não aceitou a cooptação. Explicou que tinha de obedecer ao Alto Comando e assim desestimulou o golpe.

CONTROVÉRSIAS – Há importantes contradições entre os depoimentos dos chefes militares, mas, estranhamente, não estão sendo levadas à frente pela Polícia Federal e pelo Supremo. Como eles não combinaram os depoimentos em detalhes, algumas dúvidas fundamentais ficaram no ar, mas os investigadores não tentam elucidá-las.

Pode-se dizer, sem medo de errar, que os comandantes militares eram favoráveis ao golpe e tentaram levar a trama até o fim, mas foram demovidos pela posição irredutível do Alto Comando, formado por 16 generais e que existe justamente para isso – evitar delírios antidemocráticos de poder. O raciocínio do Alto Comando foi cartesiano. Se não foi provada a fraude eleitoral, como dar um golpe?

Sabe-se também, com toda a certeza, que um oficial mentiu ao depor – o ex-comandante Freire Gomes ou o general Estevam Theóphilo. E até agora eles não foram chamados para novos depoimentos ou para uma acareação que possa provar quem está mentindo.