Há um mês o site The Intercept Brasilcomeçou a divulgar conversas comprometedoras e com claras transgressões à lei entre o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o ex-juiz Sergio Moro, o atual ministro da Justiça. Tais diálogos eram travados fora dos autos e dentro de um sistema de comunicação privada, o Telegram. Em parceria com o site, VEJA publicou em sua última edição uma reportagem de capa que mostra que a colaboração era ainda maior do que se imaginava. Na prática, Moro atuava como o chefe da força-tarefa, desequilibrando a balança da Justiça em favor da acusação. Um novo pacote de conversas obtidas pelo Intercept e analisadas em parceria com VEJA traz fortes indícios de que os diálogos impróprios dos procuradores nos chats do Telegram também ocorreram com um dos membros do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), órgão encarregado de julgar em segunda instância os processos da Lava-Jato em Curitiba. O desembargador em questão é João Pedro Gebran Neto, que atua como relator dos casos da operação. Parte dos diálogos nos quais Gebran é citado se refere a Adir Assad, um dos operadores de propinas da Petrobras e de governos estaduais, preso pela primeira vez em março de 2015. Em setembro, ele acabou condenado pelo então juiz Sergio Moro a nove anos e dez meses de prisão pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Nos chats, há sempre a possibilidade de os participantes exagerarem situações ou se portarem de forma fanfarrona, fingindo intimidade com pessoas importantes. Considerando-se, no entanto, o histórico dos diálogos, nos quais fica evidente um grau indesejável de promiscuidade entre autoridades que deveriam manter independência, é mais provável que as conversas entre Dallagnol e Gebran tenham realmente acontecido. Se confirmada essa hipótese, a falha é gravíssima. “Um juiz, independente do grau em que atue, jamais pode abrir seu voto antes de finalizá-lo, e a decisão só pode ser comunicada nos autos”, afirma o criminalista Renato Stanziola Vieira, autor do livro Paridade de Armas no Processo Penal. “Se eu sei que o desembargador está achando fraca uma parte da minha tese, claro que vou tentar fortalecê-la. Ou seja, saber antes do momento adequado o que o juiz está pensando sobre o caso concreto coloca uma das partes em vantagem.”
As provas de autoria que Gebran, a princípio, teria considerado “fracas” são depósitos feitos por ex-empresas de Assad em contas do próprio Assad. O operador de propinas apresentava como álibi o fato de já ter vendido as empresas à época em que foram usadas para escoar dinheiro desviado da Petrobras. Ocorre que, apesar de não ser mais o dono oficial, Assad continuava recebendo depósitos delas. Em sua sentença, Moro concluiu que ele permanecia no comando e, portanto, deveria ser responsabilizado. Em 27 de junho de 2017, Gebran confirmou a condenação de Assad, e seu voto foi seguido pelos outros dois desembargadores da Oitava Turma do TRF4. Às provas utilizadas na condenação de primeira instância, Gebran acrescentou em sua decisão depoimentos da delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa — que ainda estava em sigilo quando Moro assinou a sua sentença.
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