Judiciário

Número 2 do Exército no STF é sintoma de que fantasmas estão à solta

Com generais da reserva bolsonaristas a repetir declarações ameaçadoras para a democracia, o novo presidente do Supremo Tribunal Federal, José Dias Toffoli, assumiu com um gesto revelador de certas preocupações em Brasília. Pinçou um general para o cargo de assessor especial. E não foi um qualquer.

Até 31 de agosto, Fernando de Azevedo e Silva era chefe do Estado Maior do Exército, o segundo posto mais alto no comando da tropa, atrás apenas do general Eduardo Villas Bôas, o comandante geral. Teria sido este, aliás, o responsável por sugerir Azevedo e Silva a Toffoli, em resposta a uma consulta do juiz, informação que o militar não quis confirmar à reportagem.

O gaúcho Villas Bôas tem uma doença degenerativa em estágio avançado. Há tempos precisa de cadeira de rodas. Quando se falava em sua substituição, o nome do carioca Azevedo e Silva era lembrado, devido ao perfil tido como moderado, com certo trânsito político.

De 2013 a 2015, Azevedo comandou a Autoridade Pública Olímpica, entidade responsável por tirar do papel o necessário para a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro. Havia sido nomeado pela então presidente Dilma Rousseff. Depois, seguiu para o Estado Maior.

Lá, uma de suas tarefas protocolares era saudar os promovidos a general, categoria composta por cerca de 150 militares e subdividida em três subgrupos: brigada, divisão e exército. Este último é o mais importante, há uns 15 na ativa. Azevedo e Silva era um deles até deixar o comando do Estado Maior.

Na promoção de 31 de março, um dos saudados como novo general de exército foi o ex-chefe da segurança de Dilma na Presidência, o paulista Marcos Antonio Amaro dos Santos.

Observadores experientes e conhecedores dos tribunais em Brasília acreditam que a nomeação do general Azevedo e Silva para o gabinete de Toffoli foi uma tentativa do juiz de abrir um canal do STF com o Exército. O motivo? Lidar com fantasmas.

Uma desses observadores, autoridade na Procuradoria Geral da República, está preocupado e acha que o Supremo também. Jair Bolsonaro, o presidenciável abraçado por larga parcela do Exército, tem planos de esvaziar a corte atual com a ampliação do número de juízes, todos indicados, claro, em um governo dele. “Com o Bolsonaro, acabou o STF. Ele vai tratorar”, avalia o interlocutor.

Essa autoridade lembra um episódio que classifica de “impressionante”. Em abril, o general de brigada e pijama Paulo Chagas, candidato ao governo do Distrito Federal, divulgou uma carta pública dirigida a Gilmar Mendes. Aconteceu dias após o STF negar um habeas corpus a Lula, que recebera voto favorável de Mendes.

“Se a última esperança de salvar a Nação do caos, depositada pelos brasileiros nas mãos dos Ministros do STF, está desmoronando, onde estará a salvação? Estamos na fronteira entre a desordem e o caos total, o limite está bem à nossa frente”, afirma o texto. “Com a omissão do Supremo diante do caos, restarão, apenas, as Forças Armadas e isso não é ameaça é fato real!”

Chagas é um dos vários generais da reserva bolsonaristas, juntamente com Hamilton Mourão, o vice do esfaqueado, Augusto Heleno, o “plano A” para compor a chapa do presidenciável, e Luiz Eduardo da Rocha Paiva. Todos antipetistas que de algum modo difundem a ideia de valer tudo contra a crise política e o PT, inclusive um golpe à moda antiga.

Em recente entrevista à Globonews, Paiva defendeu o “autogolpe” dizendo não ser possível confiar nem no Supremo. “Vai fazer o quê? Vai esperar o esfacelamento da nação?”

Diante de tudo, diz um outro interlocutor com passagem pelas cortes de Brasília, Toffoli acertou ao chamar um general, e do alto comando do Exército, para seu gabinete. Uma decisão capaz de pavimentar o terreno para um futura decisão do STF, quem sabe até para fazê-la cumprir.

“Acho que foi uma segurança para a hipótese de soltarem o Lula e desagradarem setores mais reacionários. Ter um general ao lado sossega a tropa. Como conheço o Toffoli, acho que é isso.”

Toffoli tem o poder de soltar Lula, ao menos provisoriamente, caso bote em julgamento duas ações que contestam a prisão de condenados em segunda instância. Há quem siga que ele o fará no início de 2019.

Quando o STF negou o HC a Lula, em abril, o clima era tenso, graças aos militares. Um octogenário general da reserva, o gaúcho Luiz Gonzaga Schroeder Lessa, comentara o assunto dias antes em uma rádio. Se o STF deixasse Lula solto, disse ele, seria “indutor” de violência entre brasileiros.

Villas Bôas, o chefe da tropa, reagiu de forma ambígua via Twitter. “Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais.”

Carta Capital