Opinião

Decisão polêmica de Fachin pode ter evitado um desabamento moral gigantesco

Pedro do Coutto

O ministro Edson Fachin, aceitando recurso dos advogados de Lula, ao anular as sentenças de Sergio Moro condenando o ex-presidente, na realidade salvou o país e o próprio Supremo de um desabamento moral gigantesco, levando a uma sensação de descrédito absoluto.

Tem-se a impressão que se trata de um paradoxo , mas examinando-se bem os fatos e também a entrevista de Edson Fachin à Aguirre Talento e Bela Megale no O Globo deste sábado, chega-se à conclusão de que o ministro salvou uma situação de absoluto negativismo político e jurídico.

 ANULAÇÃO – Estava em curso na Segunda Turma do STF uma outra matéria que tem como relator o ministro Gilmar Mendes propondo a anulação de todos os atos do ex-juiz no processo global da Lava Jato. Seria um hecatombe envolvendo aspectos financeiros de pelo menos R$ 4 bilhões que seriam devolvidos à condenados, em quantias resultantes de negócios ilícitos na Petrobras.

Edson Fachin remeteu sua decisão para o Plenário do Supremo, evitando assim a Segunda Turma formada por Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, ele próprio Fachin e Nunes Marques.  O voto de Nunes Marques, ministro há pouco nomeado por Bolsonaro, é um mistério.

À primeira vista tinha-se a impressão de que ele acompanharia os votos no sentido da nulidade. Porém, pensando melhor, eu pessoalmente acredito que ele vai consultar o Palácio do Planalto porque nesta altura dos acontecimentos o que seria melhor para o presidente Jair Bolsonaro? Anular a sentença e habilitar Lula para 2022 ou manter Lula inabilitado para o desfecho das urnas da sucessão?

COMPLEXIDADE – Por aí se vê a complexidade da matéria. Em primeiro lugar, Fachin deslocou o alvo da Segunda Turma. Em segundo lugar, dirigiu o desfecho final para o Plenário, o que demonstra tacitamente a certeza de que seria derrotado na Segunda Turma, mas que poderá sair vitorioso na votação dos onze ministros.

Há um fato surpreendente: reportagem de Marcelo Rocha e Matheus Teixeira, Folha de São Paulo, que inclui declarações de Sergio Moro elogiando amplamente o ministro Edson Fachin, tendo colocado nas redes sociais um texto destacando este aspecto.

Disse Moro: “Repudio ofensas e ataques pessoais ao Ministro Edson Fachin do STF, magistrado técnico e com atuação destacada na Operação Lava Jato. Qualquer discordância quanto à decisão deve ser objeto de recurso, não de perseguição”.

ELOGIO – A impressão do paradoxo é apenas superficial ao meu ver, pois no fundo o ex-magistrado, que teve as suas sentenças anuladas, elogia e destaca o perfil de quem as anulou. Mas o fato mais sensível é que no fundo Sergio Moro ficou favorável à iniciativa de Fachin porque senão todas as suas sentenças anuladas fariam desaparecer a própria operação Lava Jato.

O caso da parcialidade não pode ser aplicado a todos os processos que foram parar em Curitiba. Se assim fosse, não haveria distinção de um processo para outro. Portanto, Fachin anulou os quatro processos específicos de Lula, não todos os processos como se pensou na Segunda Turma, com base no retrospecto de outras sentenças.

MUDANÇA DE PLANO – Um dos reflexos imediatos da candidatura de Lula foi destacado ontem no Estado de São Paulo: o governador João Doria retirou o seu nome na sucessão presidencial e vai disputar sua reeleição em São Paulo.

É provável, inclusive, que  Doria indique um nome para companheiro de chapa de Lula. Isso não afasta Rodrigo Maia da articulação política ao longo desses dois anos que nos separam das urnas. Vale a pena esperar pela reação de Ciro Gomes e de Luciano Huck.